Friday, December 21, 2007

Family Business

Cecílio Flor

Quando eu era menino, havia o Cecílio Flor.
Toda a cidade, ruas e casas, gentes e coisas,
e as ervas esquecidas das valetas, exalavam perfume,
quando lá vinha o Cecílio Flor.

Era grande, era enorme para os meus olhos de menino,
e eu ficava-me parado e pasmado quando ele atravessava
a Praça dos Arcos, numa nuvem de música, e os lojistas,
senhores do balcão, saíam e ficavam parados às portas,
porque lá vinha o Cecílio Flor a tocar ocarina.
Tinha um som de prata, de flauta e de búzio, a ocarina do
Cecílio Flor, e a Praça dos Arcos ficava cheia daquele som,
agudo e redondo, quando ele lá vinha, cego e descalço,
numa nuvem de música.

Ele não era realmente Cecílio Flor. Era só Cecílio,
mas eu acrescento-lhe a flor,
para dar nome àquele som fresco e aveludado.

O rapazito seguia-o e provocava-o, porque ele era cego,
e o Cecílio Flor, tão grande e tão forte,
chorava num choro rouco e muito fundo,
e tão pisado como uma flor amachucada.

No outro dia, lá vinha o Cecílio Flor,
e as músicas e os sons longos, finos e graves,
soltavam as asas, enquanto ele, cego e descalço,
atravessava a Praça dos Arcos a tocar ocarina.


Miguel Franco

Visitem o blog do grande poeta e escritor que era o meu avô
----
Check my grand father's blog, who was a great poet and writer.

No comments: